Ficção científica ou romance? Acho que pode ter os dois!
No. 6 é um anime da atual temporada e que acabou muito recentemente. Já faziam alguns episódios que eu estava querendo escrever o review dessa série pois percebo que eu não concordo com a opinião da maioria das pessoas sobre ela, porém, para suportar a minha ideia sobre a série eu dependia do final dela, assisti anteontem o último episódio e me surpreendi – o porquê vou explicar mais pra frente. Então, coincidentemente, o Dih veio me (ameaçar) pedir para fazer um review de No. 6, logicamente eu (não tive escolha) aceitei. Apenas também gostaria de colocar que para mim esse foi um dos melhores animes da temporada, batendo de frente somente com Usagi Drop, mas pelo andamento deste último acredito que No. 6 passou na frente.
A história
No. 6 conta a história de uma nação utópica formada por seis setores (um deles é o No. 6, que dá nome ao anime), cercados por um muro gigante que os separa do resto do mundo. Nesse lugar tudo é perfeito e maravilhoso, as pessoas são felizes e tudo está bem. Isso pelo menos é o que o governo de lá te obriga a pensar, pois existem muitos mistérios envolvendo esse lugar. Primeiro é uma série de mortes suspeitas que começa a acontecer devido a um estranho parasita que se assemelha a uma abelha, esse parasita fica dentro do corpo da pessoa em forma de casulo e quando nasce injeta um veneno no seu hospedeiro que o faz envelhecer rapidamente e logo em seguida morrer. Além disso, por trás desse mundo supostamente utópico, ou seja, passando para o outro lado de seus altos muros, se encontra pobreza, miséria, infelicidade: um lugar chamado Distrito Oeste. Existem diversas pessoas vivendo em favelas ao redor dos muros dessa cidade perfeita, pessoas passando fome, sofrendo sem ter proteção, à mercê de diversos perigos.
É nessa divisão entre dois mundos completamente distintos que dois personagens acabam por se conhecer: Shion é um garoto muito inteligente que mora em uma moderna e gigante casa na No. 6 com sua mãe, típico “garoto mimado” que possui de tudo – apesar de ele não ser uma pessoa esnobe. Do outro lado temos Nezumi, um garoto rebelde da mesma idade de Shion que está numa unidade de correção (lugar para onde mandam as pessoas que se comportam mal, duvidam ou fazem qualquer questionamento sobre a integralidade da No. 6), porém, acaba que numa noite chuvosa ele consegue fugir, ferido, daquele lugar e invade o quarto de Shion, que ao ver as feridas do outro menino o ajuda. Por ter ajudado o Nezumi a fugir, Shion e sua mãe perderam o direito de viver em Chronos (lugar luxuoso onde eles estavam) e são movidos para a Lost Town, um lugar um pouco mais humilde mas ainda dentro da No. 6. Alguns anos se passam, Shion agora está trabalhando como monitor de um parque e Karan, sua mãe, agora tem uma padaria.
Shion então presencia um colega seu de trabalho morrer pelo inseto parasita e acaba sendo capturado pelo governo que o acusa de questionar a metodologia da No. 6, mas ele é salvo pelo Nezumi que o leva para o Distrito Oeste, onde ele mora. Assim, os dois acabam se unindo para descobrir o que realmente se passa na No. 6, entretanto, de um lado Shion quer salvar a cidade achando uma cura para os parasitas, enquanto Nezumi quer a destruição da No. 6 que faz com os que estão de fora dela sofram.
Bem, esse é um típico resumo do anime que a maioria das pessoas faria, mas eu não vejo bem assim. No. 6 não é a história de um lugar que esconde um segredo caótico e dois garotos são destinados a desvendar esses mistérios. E sim a história da relação entre Shion e Nezumi, que estão inseridos nesse plano de fundo dos segredos da No. 6. Pode parecer sutil demais a diferença, mas comentarei mais a respeito na próxima seção do post.
Considerações técnicas
Muitas pessoas reclamaram que esse anime teve muito fanservice BL (Boy’s Love, por muitos também chamado de yaoi ou shounen-ai) e por isso teve seu desenvolvimento prejudicado, eu sou obrigado a discordar disso. O porquê é muito simples: o que é fanservice? Fanservice, como o nome já diz, é um serviço adicional feito para os fãs, algo que não precisaria estar ali para que a história de fato acontecesse, ele só está lá para agradar os fãs do “serviço” adicional que eles estão colocando. Clássico exemplo é o ecchi, jogar peitos e calcinhas na tela quando a história poderia perfeitamente ser contada sem esses artifícios. Ou mesmo o fanservice BL, quando por exemplo você coloca uma cena onde parece que dois caras se gostam, mas sabemos que não é verdade pois eles são héteros e um deles vai ficar com a protagonista, isso é bem comum em alguns shoujos. De face a isso, qualquer um que tenha assistido No. 6 sem fechar a mente percebe que não é o caso desse anime. A relação entre Shion e Nezumi é o que foi levando a série para frente, é o que motivou as ações dos personagens, o ponto principal da série. Por isso acho errado dizer que a aproximação dos dois é fanservice. Eu até mesmo ousaria perguntar: se o Shion fosse uma mulher e tivessem algumas dicas sutis de que o Nezumi gostasse dela – como foi o caso -, será que alguém teria visto isso como um ponto negativo e que fez a série atrasar?? É claro que não, diriam que foi um ponto importante para a evolução de ambos os personagens e o andamento da série (e foi, independente do sexo deles).
Conforme a história vai seguindo, vão surgindo cada vez mais fatos que nos fazem suspeitar de que existe algo por trás da ideologia da No. 6, mas mesmo assim Shion quer salvar as pessoas da cidade e Nezumi mesmo não podendo aceitar isso continua na companhia do inocente Shion, seus sentimentos por ele não o permitiram abandoná-lo – e foi interessante ver que até mesmo personagens secundários perceberam isso (a Inukashi). No meio dessa contradição dentro deles, nos são apresentados outros dois personagens importantes do Distrito Oeste: um deles é a Inukashi (ou “guarda-cães”) que acabei de citar, uma jovem garota com uma personalidade meio “selvagem” – o que é explicado pois ela foi criada por um cachorro -, ela trabalha em algo que se assemelha a uma pousada onde oferece, além de abrigo, cães para as pessoas se aquecerem e não morrerem de frio (logicamente ela cobra por isso). O outro personagem se chama Rikiga, um cara que agenda garotas de programa para pessoas de alto cargo da No. 6, ele estudava com a Karan e era apaixonado por ela. Quando o Rikiga é apresentado, ele sugere que o Nezumi trabalhe para ele como garoto de programa, foi muito legal ver o quanto isso irritou o Shion, uma das dicas que nos faz pensar que ele talvez tenha algum sentimento a mais pelo Nezumi – já que isso não é algo que fica 100% claro. Aliás, a Karan é outra personagem muito legal, protagonista de alguns dos momentos mais tristes da série, como no final episódio 4 quando Shion manda um bilhete para ela dizendo que ele está conseguindo sobreviver, Karan então cai no chão em lágrimas. Uma cena realmente muito bonita e comovente, ainda mais com a música de encerramento ao fundo.
Nossa, quase que eu me esqueço de outra personagem também importante que carrega alguns – vários – mistérios: Safu. Amiga e apaixonada pelo Shion, ela confessa seus sentimentos para o garoto enquanto ele ainda morava na No. 6, porém ele fica hesitante e diz que só a vê como uma amiga, provavelmente estava pensando no Nezumi. Safu então se muda para a No. 5 devido aos seus estudos, mas mesmo assim ela continua presente na série tendo estranhos desmaios, ouvindo vozes, etc. No geral os personagens são bem construídos e todos eles têm sua função dentro da série, não ficando como peso morto.
Apesar de o ponto principal do anime ser o desenvolvimento dos dois protagonistas, em nenhum momento eles esquecem do plano de fundo, que é igualmente importante. Os mistérios e conspirações apresentados te intrigam e te fazer querer saber o que vai acontecer, a dinâmica da série é muito boa – se você também estiver disposto a tentar desvendar o caso Shion x Nezumi – e com exceção de um ou dois episódios que possam ter andado um pouco devagar, o ritmo do anime é ótimo, principalmente depois da primeira metade.
Considerações Finais
No. 6 é um ótimo anime de ficção científica e também, sim, romance que te prende pelos mistérios apresentados e pela relação entre os dois protagonistas, acompanhado de um ótimo visual e uma boa trilha sonora. Talvez possa não agradar muito os diabéticos, mas eu acho besteira deixar de ver e apreciar o anime por isso. A partir de agora comentarei spoilers e revelações sobre final, se você ainda não assistiu –e pretende fazê-lo – aconselho a pular essa parte.
As coisas no anime esquentam bastante lá pelo episódio 6, quando a Safu retorna para a No. 6 devivo à morte se sua avó e percebe que algo está muito errado, pois a caixa com os pertences dela simplesmente não fazia sentido, as roupas que estavam ali não eram as que sua avó costumava usar e o principal: a agulha de tricô que ela guardava com tanto apreço para se lembrar da neta também não estava lá (alguém percebeu no episódio 10 onde estava a agulha? Foi até um pouco perturbador). Logo depois a Safu é levada pelos guardas da cidade, Karan testemunha o sequestro e avisa Nezumi, que guarda isso em segredo. Aliás, podemos ver que o Nezumi parece sentir um certo ciúmes da Safu em determinados momentos, risos. Mas logo Shion descobre que sua amiga de infância foi levada para o instituto correcional e decide salvá-la sem contar nada para o Nezumi, e para se despedir dele lhe da um “beijo de boa noite”. Cena que, para mim, confirmou os sentimentos do Shion. Ficou entre as cenas mais bonitas do anime, junto com a dança, aliás.
Mas o Nezumi logicamente não é bobo e não caiu nessa, ele sabia que o Shion planejava salvar a Safu sozinho, foi quando aconteceu a maior briga entre os dois, com direito a socos e lavação de roupa suja. Ao final da briga, eles finalmente se acertam e decidem nunca mais mentir um para o outro. Agora de cabeça fria, Shion, Nezumi, Inukashi e Rikiga bolam um plano para salvar a Safu. Quando eles finalmente chegam até a garota (depois de muita destruição e explosões) tudo é revelado: na verdade a No. 6 estava fazendo experimentos para conseguir o poder de Elyurias – não é explicado exatamente o que ela é, parece que algum tipo de deusa – e eles finalmente conseguiram utilizando o corpo da Safu, o que eu achei que talvez possa ter sido coincidência demais… Mas tudo bem. Porém, Elyurias na verdade permitiu que tudo isso acontecesse para se vingar da No. 6, que no passado destruiu seu povo. Começa então – finalmente – a ruína daquela falsa utopia (e fazia tempo que eu estava querendo ver aquela cidade ser destruída, foi muito gratificante a cena depois de tanto tempo esperando – apesar das mortes). Nezumi destrói o núcleo da No. 6 e a Safu, que na verdade agora é Elyurias, junto. O desespero do Shion tentando salvar sua amiga foi bastante marcante também, apesar de eu não ser o maior fã dela…
O anime então encerra com a destruição da No. 6 e de seus muros, unindo os dois lados daquele mundo antes dividido em dois, com certeza um novo começo de um lugar mais justo. Também sou obrigado a dizer como fiquei feliz pela Karan que finalmente vai poder rever o filho, a cena dela correndo para reencontrá-lo foi muito linda. E confesso que eu, apesar de tudo que escrevi para defender a relação dos dois personagens principais, não estava certo de como seria o final, achei que o Shion poderia terminar com a Safu, ou que algum dos dois iria morrer. Por isso, apesar deles não terem terminado exatamente juntos, fiquei bastante satisfeito com o final, pois eles tiveram coragem, por assim dizer, de deixar explícito os sentimentos dos personagens e não ter realmente transformado todos aqueles fatos anteriores em ‘fanservice’ de verdade. Isso pelo menos não é algo que costumo ver nos animes.
No final, Shion deve ter voltado para junto de sua mãe e Nezumi para sua vida de antes. Mas com certeza num futuro eles vão se reencontrar.
por Trunks